Entrevista – O papel dos/as assistentes sociais na luta contra o racismo no futebol

O racismo no futebol é um problema persistente e preocupante que afeta jogadores/as, torcedores/as e a própria imagem do esporte. O que se tem visto nas mídias, de todos os gêneros, e chamado a atenção de profissionais de diversas categorias, inclusive das confederações esportivas, são jogadores/as alvos de insultos raciais, gestos discriminatórios e comportamentos preconceituosos por parte de torcedores/as, adversários e até mesmo colegas de equipe.

Esses incidentes têm um impacto negativo profundo nos/as jogadores/as, podendo afetar seu bem-estar emocional, desempenho esportivo e até mesmo sua carreira. Além disso, eles contribuem para perpetuar estereótipos e preconceitos raciais na sociedade em geral.

O caso envolvendo o jovem craque brasileiro Vinicius Junior – Vini Jr. – trouxe à tona essa questão preocupante e tem evidenciado a luta contra o racismo, em diversas categorias do esporte, mas, mais precisamente, no futebol.

A repercussão do incidente evidencia a necessidade urgente de ações efetivas por parte das autoridades esportivas e da sociedade em geral. É fundamental que a sociedade se una em repúdio ao racismo, promovendo a educação e a conscientização (e a punição) adequada para aqueles que perpetuam esse tipo de comportamento repugnante.

É essencial que casos como o do jogador da seleção brasileira sejam um ponto de inflexão na luta contra o racismo no futebol. Os olhos do mundo estão voltados para essa questão, exigindo medidas concretas e políticas inclusivas que garantam um ambiente seguro e igualitário nos estádios.

A sociedade como um todo deve se posicionar contra o racismo, trabalhando incansavelmente para que o futebol seja um espaço de respeito, diversidade e igualdade, onde o talento e o mérito prevaleçam sobre a cor da pele.

Combater a discriminação e promover a igualdade são preceitos do esporte mais praticado no mundo e os/as assistentes sociais têm papel fundamental nestas causas. Para isso, conversamos com duas profissionais ligadas ao esporte, para discorrerem tratativas e ações que promovam o combate ao racismo, entre outras realidades, que ferem os direitos e equidades de todos dentro do futebol.

Bárbara Santos Parra, assistente social, tesoureira do CRESS-SP, atua no clube Red Bull Bragantino e histórico de sete anos no Palmeiras como assistente social nas categorias de base do futebol.

Roberta Pereira da Silva, assistente social, pesquisadora científica com ênfase no futebol de várzea e o racismo no futebol.

Futebol e racismo: o que o Serviço Social tem a ver com isso?

Bárbara: Existe uma profunda e histórica complexidade nas relações raciais no Brasil revelando o campo de disputas para intervenção do Serviço Social, pois o projeto ético-político que direciona o trabalho profissional do assistente social está na perspectiva da emancipação dos sujeitos coletivos. Nessa compreensão podemos destacar o futebol como o esporte com maior destaque no Brasil. Dessa maneira podemos compreender que por ser uma parte dessa sociedade, o racismo que existe nas relações cotidianas se expressa nos estádios, nos jogos e nas relações que envolvem essa modalidade de esporte. O combate e a luta antirracista é urgente e necessário, dentro e/ou fora de campo, uma vez que as expressões do racismo acontecem em toda e qualquer esfera das relações sociais.

 

Roberta: O combate do racismo no futebol é algo extremamente complexo e que demanda a integração de muitas forças, entre elas, os profissionais que atuam na linha de frente nesta modalidade esportiva. A característica do Serviço Social, enquanto uma profissão de segue um código de ética, que tem como princípio a não exploração e contra qualquer forma de opressão e discriminação, está inteiramente alinhada com a proposta contra o racismo. Nesse sentido, temos o código de ética que nos fundamenta nas relações no comabte ao racismo.

 

Qual é o trabalho CRESS, dentro do esporte, com foco no futebol, no sentido de atuar contra o racismo?

Bárbara: O Conselho Regional de Serviço Social tem como função precípua orientar, fiscalizar e defender a profissão. Com essa compreensão podemos destacar que os campos de atuação da profissão são vastos. Nessa qualificação, esse Conselho deve fortalecer, construir, debater, ouvir e refletir sobre os desafios cotidianos que o processo de formação esportiva apresenta, justamente alinhado com sua atribuição principal em orientar a categoria quanto à atuação nesse campo profissional e os desafios que essa modalidade apresenta por seu destaque social.

 

Roberta: O Conjunto CFESS/CRESS, ao longo da sua história, tem feito, de maneira geral, campanhas educativas, relacionadas a vários temas e acredito que, a categoria como um todo, pode pensar e discutir essas ações. Além disso, no cotidiano, no fazer profissional dos/as assistentes sociais, tanto os que atuam diretamente com o esporte, como os que atuam no território, que têm essa demanda, podem pensar ações coletivas no combate ao racismo.

 

Como atuar junto aos órgãos desportivos na luta contra o racismo?
Bárbara: Acredito que primeiramente o/a assistente social, tem como responsabilidade se aproximar do conselho com o objetivo de fortalecer a profissão, a categoria e qualificar seu trabalho com posicionamentos em concordância aos princípios e código de ética da atuação. Deve também participar dos debates promovidos nesse tema dentro dos órgãos competentes, apresentando propostas antidiscriminatórias e antirracistas. Destaco também que deve estar devidamente embasado e fortalecido para o debate, pois essa categoria profissional tem como uma das características o combate a todos os tipos de violência e violações, que por vezes pode ser cometido inclusivo por esses órgãos que participam dessas discussões.

 

Roberta: Assistentes sociais que atuam dentro das categorias de base têm os seus limites de atuação profissional. Pensando nisso é importante pontuarmos qual é o objetivo do clube e qual objetivo do Serviço Social? Obviamente, os/as assistentes sociais podem e devem pensar ações de combate ao racismo nas categorias de base, no entanto, eles/as são barrados nos limites institucionais, assim como em qualquer espaço de trabalho. No entanto, há questões “mais simples” que podem ser pensadas como: ações educativas, junto com as equipes pedagógicas e psicologia; um espaço aberto de escuta para os adolescentes poderem chegar até a equipe técnica; formação especializada para a equipe técnica, entre outras. E mais do que isso, as categorias de base precisam ser devidamente fiscalizadas. O estatuto da criança e do adolescente tem que se fazer valer, também, nas categorias de base, que precisam que o sistema de garantias de direitos estejam presentes nas categorias de base, fazendo as devidas fiscalizações, não só em relação ao racismo, mas a todas as violações de direitos que podem acontecer nesses espaços.
Existe alguma expectativa de ‘glórias’ num futuro próximo?

Bárbara: O processo de formação esportiva envolve ciclos de turbulências às glórias. Isso expressa o caminho árduo e desafiador que esse esporte apresenta. A exploração da imagem, as redes sociais, o empresariado, as lesões, o distanciamento da família, o desafio do alojamento e sua adaptação, o desgaste do corpo a longo prazo são apenas alguns elementos que permeiam essa escolha. Os 90 minutos da glória que assistimos nas redes televisivas escondem as demais 168 horas em que esses indivíduos estão inseridos como alunos, como filhos, como cidadãos, como seres humanos com necessidades particulares. Para um futuro próximo não temos uma receita pronta, tampouco especial, o investimento de tempo e financeiro é a longo prazo. E mesmo assim não significa que o resultado será essa vanglória. A educação por exemplo é um tema ausente no futebol, porém é essencial para a completude da formação intelectual, cognitiva e social desse público. Todas as áreas que permeiam o futebol devem estar em harmonia para que o resultado seja a formação integral.

Qual é a responsabilidade ou quais são as responsabilidades do Serviço Social nesta luta dentro do esporte/futebol?

Bárbara: A profissão tem caráter interventivo, é competente e preparada para análise de situações da realidade social, onde estão presentes muitos reflexos das questões sociais causadas pela desigualdade social. Nesse campo de atuação, onde há formação de jovens atletas de futebol, esse profissional tem como dever atuar na mediação das relações sociais que existem nos clubes. O Serviço Social é o departamento que facilita a adaptação dos atletas à nova realidade, trabalhando cotidianamente na harmonização das relações interpessoais. Com a autonomia do seu trabalho é responsável em elaborar e efetivar diálogos com atletas, famílias, comissão técnica e áreas interdisciplinares nos temas que dizem respeito à formação cidadã como o combate ao racismo, a todos os tipos de violência, a educação como prioridade, por exemplo.

 

Roberta: Antes mesmo de pensar no racismo no futebol, a gente precisa, de forma urgente, que o Serviço Social comece a discutir e a fomentar debates sobre a política pública de esporte. A gente acabou de ter assinada a nova lei de esporte no Brasil – Lei Geral do Esporte – LGE (PL 1.825/2022) -, que tem pontos extremamente complicados, mas eu não percebo a categoria como um todo, na discussão efetiva na implementação de uma política pública de esporte. Uma política que garanta o desenvolvimento, que pense no esporte e lazer como um direito social, como um direito público das pessoas, porque a gente precisa fazer uma diferenciação do que é o esporte, enquanto atividade para o desenvolvimento humano, para o lazer; e o que o esporte de alto rendimento. Porque no esporte de alto rendimento terão determinações muito específicas de lucro, de um objetivo de competição, de ganhar prêmios, de campeonatos ou de compra e vendas de jogadores. Hoje já temos clubes de futebol formados exclusivamente para formar jogadores para os times. Por isso há a necessidade de diferenciação do que é uma política pública do esporte e o que é o esporte de alto rendimento. Fazendo essa diferenciação, precisamos mapear, quais os/as assistentes sociais que estão trabalhando efetivamente nos centros públicos ou espaços públicos de desenvolvimento do esporte. Eu particularmente não conheço.

 

Quais outras práticas podem ser pensadas para a efetiva reflexão sobre combate ao racismo no futebol?

Bárbara: Participação em debates, seminários, projetos em instituições e órgãos que oportunizam essas reflexões, auxiliar no processo de adaptação dos novos atletas, elaborar perfil sócio-econômico onde contenha um banco de dados com informações dos atletas, inserir as famílias no processo cotidiano da formação e seu contexto, desenvolver trabalhos sócio-educativos de promoção à saúde inclusive a prevenção, acompanhar e analisar o desenvolvimento de cidadania dos atletas, elaborar, implementar e coordenar projetos sociais inclusive temas concernentes à conservação do ambiente. Dessa forma, a/o assistente social é um educador social, que se dedica a longo prazo para a transformação de vidas e hábitos por meio da socialização de informações e discussões reflexivas, colaborando com o equilíbrio do atleta dentro e fora de campo.

 

 

 

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