CRESS SP ganha novo portal para defesa dos direitos humanos

O CRESS São Paulo ganha novo portal para defesa dos direitos humanos com ações e ferramentas para aproximar categoria e fortalecer voz contra violações.

No Dia Internacional em que se celebra as lutas sociais que conquistaram direitos humanos, o CRESS-SP reforça a importância e atualidade da apropriação dos instrumentos para defesa e debate sobre os direitos humanos entre os e as assistentes sociais. O lançamento do novo Portal faz parte da atuação do CRESS-SP em busca da concretização do projeto ético político. Confira abaixo a reportagem especial sobre o Dia Internacional dos Direitos Humanos e sobre a situação (crítica) dos direitos humanos no Brasil.
Como está previsto no Código de Ética de 1993, o Serviço Social é norteado pelos Direitos Humanos. O segundo principio do Código estabelece o compromisso da categoria com a “Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo”.

Um breve histórico sobre a constituição jurídica dos direitos humanos, em nível internacional, mostra que a reflexão sobre a necessidade de existir um consenso e comprometimento dos Estados para proteção dos direitos humanos foi acentuada após a vivência e registros dos horrores da 2a Guerra Mundial causados pelo nazismo e fascismo, o que acabou dando origem à Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948.
Desde então, os direitos humanos são compreendidos como universais, integrais e interdependentes, ou seja, são direitos que se relacionam entre si e representam um arcabouço de garantias de humanidade que devem ser assegurados a todos os seres humanos para que se tenha uma vida digna.
No entanto, os direitos humanos encontram barreiras para se concretizar nos limites sociais e econômicos impostos pela lógica capitalista, a mesma lógica que retroalimenta a desigualdade social e opressões cotidianas.
Diante desse quadro, o CRESS-SP apresenta dados recentes para ilustrar a atualidade da necessidade de implementação dos direitos humanos no Brasil e mostrar como as vioalações aos direitos humanos atingem a grande maioria dos brasileiros – mulheres, homens, trabalhadores/as, estudantes, idosos/as, crianças, adolescentes, pessoas com deficiência, população LGBT, negra e em situação de rua, etc.

Mapeamento de grupos afetados pelas múltiplas expressões da violência no Brasil:

1. Violência contra mulher
Segundo o Instituto Shangari, com base em dados divulgados pela Organização Mundial da Ssaúde (órgão ligado à ONU), o Brasil fica em sétimo lugar no ranking de mortes de mulheres vítimas de agressão, contabilizando mais de 90 mil mortes nos últimos 30 anos.
Entre 2001 a 2011, ocorreram mais de 50 mil feminicídios no Brasil. São 5 mil por ano. Acredita-se que grande parte foram decorrentes de violência doméstica e familiar, uma vez que aproximadamente um terço das mortes aconteceram em casa.
Só em 2014, o Brasil teve pelo menos 47 mil estupros contablizados. Mas o Fórum Brasileiro de Segurança Pública acredita que podem ter ocorrido entre 136 mil e 476 mil casos devido a que se denomina subnotificação do crime. Existem dois cenários: o estudo “Estupro no Brasil: uma radiografia segundo os dados da Saúde”, do Ipea, que aponta que apenas 10% dos casos chegam ao conhecimento da polícia; e outro internacional, que aponta que apenas 35% das vítimas desse tipo de crime prestam queixa. E elas estão isoladas pela falta de confiança na Justiça e na polícia. Dados apontam que 52% das pessoas acham que juízes e policiais desqualificam o problema da violência contra a mulher.
Outra causa agravante para aumentar os casos de mulheres mortas no Brasil é a criminalização do aborto. Grupos religiosos, a exemplo da forte bancada evangélica no Congresso Nacional, continuam a pressionar as autoridades para que o aborto seja criminalizado em todas as circunstâncias, e buscam aprovação de uma lei para que o aborto seja proibido até mesmo quando a mulher foi vítima de estupro – atualmente, o direito brasileiro permite o aborto em casos de estupro, ameaça à vida da mulher e fetos anencéfalos. Esse conjunto limitado de possibilidades faz com que muitas mulheres recorram a abortos clandestinos e inseguros. Em setembro de 2014, os casos de Jandira dos Santos Cruz e Elisângela Barbosa comoveram o país. As duas mulheres morreram depois de fazer abortos clandestinos em clínicas do Rio de Janeiro. O corpo de Jandira dos Santos Cruz foi escondido de seus familiares e incinerado por funcionários da clínica.
Confira aqui a íntegra do Relatório da Violência contra Mulher de 2015.

 

2. Violência contra jovens, especialmente juventude negra
Segundo a ONG “Anistia Internacional”, o Brasil é o país onde mais se mata no mundo. Mais da metade dos homicídios tem como alvo jovens entre 15 e 29 anos, sendo 77% cometidos contra negros.
Em 2012, 56.000 pessoas foram assassinadas no Brasil. Destas, 30.000 são jovens entre 15 a 29 anos. A maioria dos homicídios é praticado por armas de fogo, e menos de 8% dos casos chegam a ser julgados.
O escândalo mais recente, em 28 de novembro de 2015, foi o genocídio de 5 jovens negros mortos dentro de um carro por 111 tiros disparados pela Policia Militar na periferia do Rio de Janeiro. O secretário da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), André Barros, acompanhou toda a investigação. “Esse genocídio dos cinco jovens negros, atingidos com 111 tiros acontece por conta de uma política histórica do Estado brasileiro de genocídio contra os negros. Nós vivemos um Estado de Genocídio”, concluiu Barros. O advogado ainda expôs que existe uma lei que tipifica o crime de genocídio que é quando um grupo é atacado por razões raciais, étnicas ou religiosas. Além disso, o advogado faz questão de frisar em seus depoimentos que “as práticas como ocultação de cadáver, alteração da cena do crime, desaparecimentos são práticas que vêm da Ditadura Militar e permanecem até hoje na polícia”.
Em março deste ano, a situação da juventude negra no Brasil foi levada por organizações não governamentais à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), onde representantes do Governo brasileiro presentes na audiência admitiram o cenário de extermínio no país. O Secretário de Políticas de Ações Afirmativas da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Ronaldo Crispim Sena Barros, assumiu que “o Governo Federal avalia que parte da elevada taxa de homicídio dos jovens negros deve ser atribuída ao racismo”.
Embora tenha reconhecido o extermínio durante a audiência na CIDH, o Estado se calou quando foram apresentadas graves denúncias de violações de direitos humanos relacionadas ao sistema socioeducativo, como os casos nos estados do Maranhão, Ceará e Pernambuco, que envolvem adolescentes feridos com armas de fogo dentro das unidades, incluindo maus tratos e torturas.
Outras discussões recentes sobre a violação de direitos humanos da população jovem no Brasil envolvem o desarquivamento da PEC 171/93 (projeto que altera a Constituição Federal), que prevê a redução da maioridade penal, medida claramente contrária aos direitos humanos das crianças e adolescentes. A medida contraria tratados internacionais de direitos humanos e já foi repudiada pela ONU e CIDH.
Confira aqui a íntegra da audiência realizada na CIDH em Washington.

Assista aqui ao vídeo apresentado no início da audiência com o depoimento de mães que tiveram seus filhos vitimados pela violência do Estado.

 

3. Violência contra população LGBT
Em maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça aprovou uma resolução autorizando o casamento entre pessoas do mesmo sexo, após uma decisão similar do Supremo Tribunal Federal de 2011. Apesar da vitória para essas populações historicamente discriminadas, lideranças políticas e religiosas continuaram a fazer frequentes declarações e ações homofóbicas. Políticos conservadores vetaram uma série de iniciativas pública e o governo federal acabou cedendo e inviabilizando a distribuição materiais de educação em direitos humanos nas escolas com o fim de conter a discriminação motivada pela orientação sexual.
De acordo com Relatório da ONG Grupo Gay da Bahia (GGB) de 2014, o Brasil continua sendo o campeão mundial de crimes motivados pela homo/transfobia: segundo agências internacionais, 50% dos assassinatos de transexuais no ano passado foram cometidos em nosso país. Dos 326 mortos, 163 eram gays, 134 travestis, 14 lésbicas, 3 bissexuais e 7 amantes de travestis (T-lovers).
Foram igualmente assassinados 7 heterossexuais, por terem sido confundidos com gays ou por estarem em circunstâncias ou espaços homoeróticos. Em números absolutos, os estados onde mais LGBT foram assassinados foram São Paulo (50) e Minas Gerais (30). Porém, em termos relativos, Paraíba e Piauí e suas respectivas capitais, são os locais que oferecem maior risco aos LGBT de serem violentamente mortos.
Confira aqui a íntegra do Relatório Anual de Assassinatos de Homossexuais no Brasil.

 

4. Violência contra povos indígenas e quilombolas
Apenas em 2014, o Relatório do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) registrou 138 casos de assassinatos e 135 casos de suicídios de indígenas no Brasil, sendo que destes, 41 assassinatos e 48 suicídios aconteceram no Mato Grosso do Sul. Os dados também revelam um severo aumento das mortes por desassistência à saúde, mortalidade na infância, invasões possessórias e exploração ilegal de recursos naturais, e de omissão e morosidade na regularização das terras indígenas.
Ainda, está em andamento no Congresso Nacional um projeto de lei que, se aprovado, irá transferir a responsabilidade pela demarcação de terras indígenas, quilombolas e de unidades de conservação, do poder Executivo, que já é problemática, para o Legislativo, onde a bancada do agronegócio tem grande poder e interesse na expulsão dos indígenas de suas terras. A proposta de um novo Código de Mineração também expõe as comunidades tradicionais ao risco de que atividades empresariais possam se instalar em suas terras sem sua permissão, o que viola o direito internacional.
As comunidades quilombolas seguem lutando pelo reconhecimento de seu direito à terra. O demorado processo para resolver reivindicações de terras não só resulta em conflitos, como deixa as comunidades vulneráveis a ameaças e violências de pistoleiros e fazendeiros locais. A comunidade de São José de Bruno, no Maranhão, por exemplo, enfrentou ameaças diretas em outubro de 2014, quando um fazendeiro invadiu parte de suas terras. No Brasil, trinta e quatro pessoas foram mortas em consequência de conflitos por terras em 2013, três delas no estado do Maranhão. Entre janeiro e outubro de 2014, cinco pessoas foram mortas em disputas por terras no estado de São Paulo.
A impunidade por esses crimes continua a alimentar o ciclo de violência. Os responsáveis pelo assassinato do líder quilombola Flaviano Pinto Neto, em outubro de 2010, ainda não haviam sido levados à Justiça, apesar de uma investigação policial ter identificado quatro suspeitos. Novamente, em outubro desse ano, a situação de violência contra indígenas e a omissão do Estado brasileiro na proteção da população indígena foi levada por organizações não governamentais à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Confira aqui na íntegra o Relatório de Violência contra os Povos Indígenas no Brasil.

 

5. Violação à liberdade de expressão de comunicadores e defensores de direitos humanos
No dia 6 de agosto desse ano, um radialista foi morto a tiros enquanto apresentava um programa em Camocim, no Ceará. O relógio da Liberdade FM marcava 12h40 quando um homem rendeu a recepcionista e outro mandou o operador de áudio se abaixar. Gleydson Carvalho levou três tiros, um deles na cabeça.
A investigação apontou envolvimento de sete pessoas no crime – entre elas o tio e o sobrinho do prefeito de uma cidade vizinha. Conhecido pelas denúncias e cobranças contra políticos da região, Gleydson morreu por “falar demais”.
A organização internacional de direitos humanos ARTIGO 19, que atua na defesa e promoção da liberdade de expressão e acesso à informação, realiza anualmente o monitoramento de casos de violência contra comunicadores e defensores de direitos humanos e afirma que o caso de Gleydson não é isolado.
Como aponta levantamento da ARTIGO 19, apenas no primeiro semestre de 2015, um jornalista e três radialistas já foram mortos em decorrência de sua atividade profissional, e são investigadas a relação com a profissão em outros três homicídios.
Contabilizando também os casos de defensores de direitos humanos com o de comunicadores, foram registrados 55 casos de violação à liberdade de expressão em 2014, um aumento de 15% em relação a 2013, quando foram registrados 45 casos.
Dos 55 casos, 15 foram homicídios, 11 foram tentativas de assassinatos, 28 foram ameaças de morte e 1 deles, tortura.
A escalada de violações ao longo dos anos levou o Estado brasileiro a ser denunciado, em outubro desse ano, na CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos), órgão ligado à OEA (Organização dos Estados Americanos).
Também houve denúncias específicas à CIDH com relação às violações à liberdade de expresão cometidas para reprimir e criminalizar protestos, que teve ampla cobertura midiática durante as massivas manifestações que tomaram as ruas do Brasil desde as Jornadas de Junho de 2013 e persistiram até a Copa do Mundo. Os mesmos abusos policiais foram recentemente observados na repressão aos protestos organizados pelos estudantes secundaristas em São Paulo contra a reorganização escolar que propõe fechar escolas e transferir milhares de alunos para escolas de ciclo único. A impunidade das autoridades em todos os episódios é regra, e um grande incentivo para que se continue a atacar as liberdades democráticas e os direitos humanos, com a convicção de que os crimes não serão encaminhados para a justiça.
Confira aqui a íntegra do Relatório Violações à Liberdade de Expressão.

 

6. Violência contra trabalhadores rurais
Os casos de violência no campo aumentaram no último ano, segundo o relatório “Conflitos no Campo no Brasil 2014” da Comissão Pastoral da Terra.
O levantamento mostra que o número de homicídios relacionados a conflitos no campo aumentou 6%, de 34 em 2013 para 36 em 2014. O crescimento se deu principalmente pelos casos registrados na região Centro-Oeste, de 6 para 8 (33%) e Sul, de 1 para 3 (200%).
O estado com o maior número de registros é o Pará, com 9 homicídios. Rondônia e Mato Grosso vêm a seguir, com 5 asssinatos. O Pará apresentou crescimento de 50% no número de mortes por conflito agrário (6 casos em 2013 e 9 casos em 2014) e Rondônia 400% (1 em 2013, 5 em 2014).
A variação de maior destaque se deu entre as tentativas de assassinato. De 15 tentativas em 2013, o número saltou para 56 em 2014, um crescimento de 273%. Esse crescimento se deu em todas as regiões do Brasil, menos no Centro-Oeste, onde o número caiu de 7 para 3.
Outros dados que chamam a atenção são o número de despejos de campo e o de conflitos relacionados à água. Em 2013, foram despejadas 6.358 famílias, número que passou para 12.188 ano passado, um aumento equivalente 92%. O número de famílias ameaçadas de despejo também cresceu: passou de 19.250 para 29.280, aumento de 52%. Os casos de disputa por água têm crescido nos últimos 4 anos, passando de 68 em 2011 para 127 em 2014.
A ausência de punição associada à disputa por terras por grandes latifundiários é apontada como uma das principais causas da violência no campo.
Confira aqui a íntegra do Relatório CONFLITOS NO CAMPO BRASIL .

 

Direitos Humanos e Serviço Social
É importante reconhecer que o mapeamento das violações aos direitos humanos no Brasil mostra os enormes desafios para superação dessa realidade e na luta pela emancipação humana.
Esse quadro de violência mostra o quanto é necessário avançar na conquista por direitos, e ainda mais, na efetivação dos mesmos no dia a dia de cada indivíduo. Já existe uma agenda propositiva nesse sentido, e é nessa perspectiva que, na história do serviço social brasileiro, a luta por direitos faz parte da pauta das entidades representativas, desde o final dos anos 1970.
A luta por melhores condições de trabalho, como todas as lutas da classe trabalhadora, se insere nas conquistas por direitos humanos. Como está expresso em coletânea de materiais do CFESS, os direitos da classe trabalhadora “constituem uma pauta permanente, daí a importante conquista da Lei 12.317/2010, que garante direito à redução da jornada de trabalho de assistentes sociais sem redução dos salários. Luta esta que não se restringe a uma reivindicação meramente econômico-corporativa, e sim objetiva, garantindo maior qualidade dos serviços prestados à população usuária. É com base nesse entendimento que a luta por direitos exige desnaturalizar a exploração de classe e as múltiplas expressões da violência que ocorrem no cotidiano da sociedade brasileira”.
Além das dificuldades já existentes no seio da sociedade brasileira, na contramão dos direitos trabalhistas correm projetos de lei que atacam ainda mais a delicada situação da população brasileira. O PL 4330, por exemplo, já foi aprovado pela Câmara dos Deputados, e pretende por fim à responsabilidade das empresas contratantes de terceirizadas sobre desmandos e ações ilegais para com os funcionários. Se aprovado pelo Senado, o projeto poderia atingir todas as atividades das empresas privadas, estatais e do serviço público, gerando ainda mais desemprego em favor de empresas que contratem terceirizados.

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