Serviço Social nas lutas *LGBT+, por princípio ético e em defesa do direito à vida

Em entrevista ao site do CRESS-SP, o assistente social Ubiratan de Souza Dias Junior*, da Direção Estadual do Conselho, fala de como a defesa dos direitos LGBT+ perpassa o exercício profissional dos/as assistentes sociais

 

O Brasil coleciona tristes estatísticas de crimes de LGBTfobia e só recentemente começou a avançar no campo dos direitos LGBT+. Todas as conquistas até aqui são resultado da luta e organização dos movimentos LGBT+ no país, e precisam ser mantidas e ampliadas, principalmente com o agravamento da crise social brasileira, desencadeado, entre outros, pela pandemia do novo coronavírus.

É nesse contexto que o Serviço Social estabelece uma relação direta e fundamental com a população LGBT+, na defesa e garantia de acesso a direitos sociais e humanos, por meio da atuação profissional de assistentes sociais.

Para provocar a reflexão sobre esse vínculo tão importante, o site do CRESS-SP conversou com o assistente social e Conselheiro Estadual Ubiratan de Souza Dias Junior, membro da Direção Estadual do CRESS-SP na atual gestão Ampliações: Em defesa do Serviço Social, nos encontramos na luta!.

Os onze princípios do Código de Ética já deixam objetivo o dever ético do/a assistente social na defesa intransigente dos direitos humanos, e, aí, em especial, dos/as LGBT+. Além disso, é dever do/a assistente social se colocar também na luta anti-homofóbica, antilesbofóbica, antitransfóbica, antiLGBT+fóbica

 

CRESS-SP: Podemos dizer que, no Brasil, a profissão de assistente social tem uma relação direta com a população LGBT+? Esta relação está prevista no CEP?

Ubiratan Souza Dias Jr – Conselheiro Estadual, triênio 2020-2023

Ubiratan de Souza Dias Junior: A relação direta prevista com o Código de Ética parte dos onze princípios norteadores para a atuação profissional. A gente destaca alguns em especial, como o Princípio XI, que fala em não discriminar — “Exercício do Serviço Social sem ser discriminado/a, nem discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero, idade e condição física”. Temos também, no nosso Princípio VI, diversidade — “Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e à discussão das diferenças”. O Princípio V, que fala sobre justiça social, o nosso Princípio I, que é o reconhecimento da liberdade como valor ético central, o Princípio II, que fala sobre os direitos humanos.

A população LGBT+, assim como os/as assistentes sociais, faz parte da classe trabalhadora, que, numa sociedade capitalista, é subdividida em classes. As ditas classes menos favorecidas, que são a grande maioria do público usuário do serviço social, tendem a procurar as políticas sociais — que são, majoritariamente, onde os/as assistentes sociais estão lotados/as —  para acesso aos direitos sociais que visam os mínimos necessários. O serviço social é acionado pela população por meio dessas políticas sociais, para dar um suporte necessário nessa mediação entre os/as usuários/as e as políticas.

Assim, é possível afirmar que há uma relação direta das reivindicações, das pautas LGBT+ com o Serviço Social, seja via direitos sociais, que podem se expressar em  políticas sociais, seja pelos princípios do CEP, seja por consciência de classe.

 

CRESS-SP: Na prática, como essa relação acontece, pensando, primeiramente, no trabalho de assistentes sociais com a população nas políticas públicas?

Ubiratan: Eu acho que acontece neste sentido, da busca dos mínimos necessários para sobreviver. A população LGBT+ procura, por exemplo, o serviço social dentro das políticas sociais. No campo da assistência social, o público LGBT+ em situação de rua vai procurar assistência para ter um acolhimento, para fazer o Bolsa Família, para ter acesso a algum benefício de transferência de renda. Vai procurar Habitação para ver se há a possibilidade de um aluguel social ou de uma inserção em algum projeto de habitação de interesse social. Na Saúde, para assistência em processo de acompanhamento da hormonioterapia, para ter acesso a consulta básica de endocrinologista, entre outros.

Além disso, por meio dos serviços complementares, vai procurar assistência para um suporte jurídico no processo de nome social, ou, pela Política de Direitos Humanos, quando tem algum direito violado no campo dessas ofertas dos serviços socioassistenciais… Enfim, são várias expressões em que a população, através dos serviços e das políticas, aparece na prática profissional do/a assistente social.

 

CRESS-SP: Qual é o impacto da atuação de assistentes sociais na assistência e na construção dessas políticas públicas?

Ubiratan: É assegurando as particularidades que a população LGBT+ apresenta. São particularidades como o respeito à identidade de gênero, não confundir identidade de gênero com sexo atribuído no nascimento, contribuir na questão étnico-racial, compreendendo que a dimensão étnico-racial também faz parte de uma pauta do movimento LGBT+… É diferente ser LGBT+ branco/a e LGBT+ negro/a, as expressões da questão social perpassam de maneira mais dura para a população étnico-racial LGBT+. O impacto está traduzido no lado de que o/a assistente social escolhe estar, considerando as pressões institucionais, conjunturais e políticas. Sabemos do nosso lugar: o nosso lugar é do lado da classe trabalhadora, dos/as LGBT+.

O/A assistente social também compõe diversos espaços e consegue fazer um diálogo mais articulado com as outras políticas, serviços e movimentos. Incide nas lacunas das políticas para atender às especificidades da população.

 

CRESS-SP: O/A assistente social pode atuar no sentido de educar a população LGBT+ e a sociedade, como um todo, sobre diversidade sexual e de gênero, e sobre direitos LGBT+?

Ubiratan: Esta é uma atribuição [do/a assistente social]. Eu acho que todas as profissões que trabalham com o social devem se implicar nesse processo. O Serviço Social, em particular, tem uma construção diferenciada, que faz uso de uma perspectiva crítica marxista na leitura da realidade social. Então, ele consegue apresentar elementos constitutivos que fazem parte de particularidades dos/as LGBT+ que conseguem, sim, contribuir com uma educação da população LGBT+, correlacionando algumas pautas específicas da população LGBT+ com pautas estruturais, com pautas mais “político-econômicas”, vamos dizer assim.

Como bem diz o nosso Princípio II, que é a defesa intransigente dos direitos humanos e a recusa do arbítrio e do autoritarismo, e também vinculado ao Princípio III, que fala sobre a cidadania, a ampliação e a consolidação da cidadania, consideradas tarefas primordiais de toda a sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis, sociais e políticos das classes trabalhadoras. Eu acho que o/a assistente social atua mais nessa perspectiva, colaborando com a construção das reivindicações da população LGBT+.

 

CRESS-SP: Como o Serviço Social contribui para a construção teórica sobre os temas LGBT+?

Ubiratan: O Serviço Social contribui nas reflexões políticas sobre a pauta, correlacionando a dinâmica da sociedade capitalista e o impacto no mundo do trabalho nas suas múltiplas dimensões. Dá ênfase às barbaridades que o sistema produz e que ferem diariamente a classe trabalhadora, principalmente no campo dos direitos humanos. Denunciamos, por meio das nossas reflexões, a ineficiência quando falamos de um “Estado de Bem-Estar Social” dentro deste sistema e desta sociabilidade. Enfim, construímos, dessa forma, conhecimentos que se somam às contribuições das demais áreas.

 

CRESS-SP: Em que medida o Serviço Social deve se inserir nos debates sobre diversidade sexual e de gênero?

Ubiratan: Os onze princípios do Código de Ética já deixam objetivo o dever ético do/a assistente social na defesa intransigente dos direitos humanos, e, aí, em especial, dos/as LGBT+. Além disso, é dever do/a assistente social se colocar também na luta anti-homofóbica, antilesbofóbica, antitransfóbica, antiLGBT+fóbica. É um dever ético-político do/a assistente social estar nesse caminho, nessa perspectiva.

 

CRESS-SP: De que forma a população LGBT+ está presente e é inserida na categoria profissional de assistentes sociais?

Ubiratan: Da forma mais simples: nós somos gays, lésbicas, bissexuais, pessoas trans e +, profissionais iguais aos/às demais. E, por vezes, como profissional nas instituições, a gente se choca também com algumas violências no campo das LGBTfobias institucionais, em detrimento do trabalho que prestamos, por causa da nossa identidade de gênero ou da nossa orientação sexual. É uma via de mão dupla: nós somos LGBT+, mas também — e não só — defendemos o acesso do nosso público usuário na relação com essas instituições.

 

Há uma relação direta das reivindicações, das pautas LGBT+ com o Serviço Social, seja via direitos sociais, que podem se expressar em políticas sociais, seja pelos princípios do CEP, seja por consciência de classe

 

*Ubiratan de Souza Dias Junior é assistente social, Mestre em Serviço Social e Políticas Sociais pela Unifesp e doutorando em Serviço Social pela PUC-SP. Com experiência em diversas áreas, como Habitação e Direitos Humanos, atuou com a população em situação de rua, via OSC, no Serviço Especializado de Abordagem Social (SEAS) da região central de São Paulo, da Prefeitura de São Paulo e atualmente trabalha com projetos sociais para adolescências e juventudes sobre a relação da política de Assistência Social e o mundo do trabalho. É Conselheiro Estadual do CRESS-SP na gestão Ampliações: Em defesa do Serviço Social, nos encontramos na luta!.

 

* O CRESS-SP, em decisão colegiada, opta pela utilização da sigla “LGBT+” em função das consultas a movimentos sociais, que indicam não haver consenso na utilização das demais siglas que se somam às primeiras. O entendimento é de que o símbolo “+” abarca as demais representações simbólicas

 

 

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